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CASACOR São Paulo: 70º ambiente da mostra estará no Jardim Colombo

Em ação inédita, Ester Carro estenderá o circuito da mostra para fora do Conjunto Nacional. Após finalizado, espaço poderá ser acessado por visitas guiadas

Por Vanessa D'Amaro
Atualizado em 18 Maio 2024, 16h06 - Publicado em 18 Maio 2024, 15h26

Distante cerca de 12 km da Avenida Paulista, em uma viela do Jardim Colombo, parte do complexo de Paraisópolis, o entregador Wallece Gonzaga de Souza habita um cômodo de apenas 7,30 m2, com um banheiro improvisado. Como não há chuveiro nem estrutura para encanamento, todo dia ele precisa arrumar um horário para tomar banho na casa da mãe, pertinho dali. “É ruim porque ela dorme cedo para sair de manhã para trabalhar. Evito chegar muito tarde para não atrapalhar”, conta. Até pouco tempo atrás, Wallece alimentava o sonho do banheiro próprio, projeto que começou a tomar forma no início do ano. Ele só não imaginava que a obra, impulsionada pela CASACOR São Paulo, acabaria por se tornar uma extensão da mostra, em uma ação orquestrada pela arquiteta e ativista Ester Carro com Livia Pedreira, presidente do conselho curador.

Mais que um chuveiro

 

A Casa de Wallece de Ester Carro na CASACOR São Paulo 2024.
“Considero uma continuidade do trabalho do ano passado, quando discutimos a periferia dentro da mostra. Desta vez, tomamos o caminho inverso”, explica Ester Carro sobre a Casa de Wallece. (Reprodução/CASACOR)

A ideia sucede a repercussão positiva do Espaço Motirõ, em 2023, dedicado ao morar periférico. Nesta sua segunda participação, Ester deu um passo além na abordagem do tema: lidou não com um ambiente controlado, mas, sim, com uma história e um cenário reais da cidade. “Considero uma continuidade do trabalho do ano passado, quando discutimos a periferia dentro da mostra. Desta vez, tomamos o caminho inverso. Vamos provar que a arquitetura social consegue provocar mudanças”, argumenta. Ela comanda o Instituto Fazendinhando, que, além de recuperar áreas abandonadas, tem oferecido cursos de formação na construção civil para mulheres da comunidade e reformado moradias do bairro. A instituição conta, desde 2020, com o apoio da CASACOR São Paulo, que fornece insumos para a concretização dessas ações, incluindo materiais e objetos remanescentes das edições anteriores. Para montar a Casa do Wallece, o ambiente avançado do percurso, Ester ampliou a metragem, totalizando 10,50 m2.

A Casa de Wallece de Ester Carro na CASACOR São Paulo 2024.
Antes da reforma (foto), a casa precisava conquistar uma estrutura de residência. “Planejamos uma cama elevada, em uma espécie de mezanino. Também aumentamos a quantidade de janelas”, descreve Ester. (Reprodução/CASACOR)

Com pouco espaço na lateral do terreno, ela olhou para o alto e sugeriu a criação de um pé-direito duplo com uma laje reforçada substituindo as antigas telhas de amianto. A fachada cresceu e recebeu uma horta vertical montada com paletes, além de um grafite do artista local Julio Jesus – que deve torná-la um novo ponto de referência no Colombo.

Nos interiores, a profissional aproveitou cada canto para conquistar uma estrutura completa de residência. “Planejamos uma cama elevada, em uma espécie de mezanino. Também aumentamos a quantidade de janelas”, descreve. Abaixo da área de dormir, surgiram armários sob medida e, na sequência, uma pequena bancada de cozinha, geladeira e um tanque. Na ponta da casa, ergue-se o desejado banheiro. “Eu só queria mesmo um lugar para tomar banho e ter alguma privacidade. Agora, é como se eu
tivesse ganhado na loteria”, fala Wallece. Com tantas perspectivas renovadas, ele não esconde o entusiasmo: “Quero inspirar mais gente a ajudar o Instituto. Quem está no alto escalão pode doar e mudar vidas. Essa iniciativa vai fazer história”, diz, esperançoso.

A Casa de Wallece de Ester Carro na CASACOR São Paulo 2024.
“Um layout bem planejado pode impactar a saúde física e mental de uma pessoa periférica”, explica Ester. Na foto, a residência antes da reforma. (Reprodução/CASACOR)

Para Ester, a ousadia de incluir uma moradia real na CASACOR vem de um esforço de sensibilização do público. “A história do Wallece não é exceção. Essa é a situação de vários entregadores e motoboys paulistanos, jovens que não tiveram acesso à educação e que estão batalhando no dia a dia. Devemos dar voz a quem está invisibilizado”, afirma. “Muitos moram em lugares assim sem qualquer auxílio técnico. A arquitetura que aprendemos na faculdade acaba ficando muito longe dessa realidade. E um layout bem planejado pode impactar a saúde física e mental de uma pessoa periférica. Hoje, no Fazendinhando, temos a missão de lutar por dignidade para essa população”, completa a arquiteta.

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A Casa do Wallece estará aberta a tours guiados organizados pela CASACOR e pelo Instituto Fazendinhando, a serem divulgados em nossos canais digitais. A respeito da expectativa sobre a reação dos visitantes, Ester afirma, convicta do valor simbólico do espaço: “A partir do momento em que a CASACOR encampa essa iniciativa social, isso influencia e engaja muita gente”.

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